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Efeito COVID-19 sobre as receitas e lucro operacional das empresas

Quais os setores mais afetados mundialmente?

Aswath Damodaran, professor da Stern School of Business at New York University, publicou recentemente em seu site um estudo do efeito da pandemia COVID-19 no mundo dos negócios. Os dados se referem ao ano de 2020. Tal estudo envolve a análise de mais de 40 mil empresas de capital aberto, dos mais diferentes setores, em todo o mundo.

O resultado demonstrou que as empresas (exceto empresas financeiras e bancos) tiveram um resultado geral praticamente nulo em 2020. Entre 2019 e 2020, a receita de todas as empresas listadas em bolsas de valores no mundo cresceu 0,33% enquanto o lucro operacional caiu -3,03%.

Quando analisamos somente a queda da receita, observamos que a maior ocorreu para a indústria de transporte aéreo e hotéis, conforme os números abaixo:

Os setores que mais cresceram em receita foram:

Quando avaliamos as quedas de lucro operacional, a maior delas está no setor de óleo e gás, seguido pelo setor de hotéis:

Os maiores ganhos de lucros operacionais foram do setor de metais preciosos e, em segundo lugar, da agroindústria:

Analisando, de maneira bastante ampla, temos que os setores que mais sofreram, ao longo de 2020, foram os setores de hotéis, aviação e óleo e gás. Por outro lado, os mais beneficiados foram os de metais preciosos, varejo (online e material de construção) e agricultura.

O senso econômico comum já poderia prever quedas expressivas no setor de hotelaria e aviação, mas talvez não em óleo e gás. Verificando os setores que mais ganharam, uma vez mais já eram de conhecimento os ganhos das vendas on-line e itens para a casa; porém, o setor que mais cresceu foi o de metais preciosos, talvez por representar um porto seguro em último estágio.

O lucro da Petrobras é bom? Depende

O lucro anunciado pela Petrobras no segundo trimestre do ano nos leva a uma reflexão mais sociológica que econômica. Do ponto de vista empresarial, das decisões de gestão, podemos dizer que a empresa está adotando uma estratégia focada no rápido restabelecimento de suas margens de lucro. Isso era de se esperar. Depois de toda a crise institucional, política, econômica e até policial que sofreu, o resultado positivo dá evidências de que estão arrumando a casa e buscam um caminho viável para sair do atoleiro. Mas quando se olha para situação do país, a pergunta é: a que custo?

A guinada começou em julho de 2017, com a mudança das políticas de preço praticadas pela petroleira. A Agência Nacional do Petróleo (ANP) autorizou que os valores dos combustíveis fossem reajustados diariamente, se necessário, considerando duas variáveis: o preço internacional do barril de petróleo e as variações cambiais. Com isso, a empresa atrelou sua receita ao dólar, criando uma situação favorável para sua arrecadação em períodos de forte valorização da moeda estrangeira, como observado neste segundo trimestre. A partir dessa política de reajuste de preços, a Petrobras ganhou mais fôlego para negociar suas dívidas bilionárias no mercado financeiro. O hedge (proteção) natural da receita em dólares foi fator relevante para a empresa reduzir seu nível de endividamento e apresentar indicadores econômico-financeiros mais saudáveis.

De julho de 2017 a junho de 2018, período no qual a Petrobras adotou sua política de preço de combustíveis, o barril do petróleo no mercado internacional subiu cerca de 50% e o dólar valorizou-se em aproximadamente 15%. As combinações desses dois movimentos fizeram com que a empresa repassasse esses reajustes aos consumidor final, em virtude de seu poder de mercado. O posicionamento dominante da Petrobras no refino de combustíveis possibilita que movimentos internacionais no preço do barril de petróleo seja repassado, praticamente de forma integral, às distribuidoras. Preços mais elevados da gasolina e do diesel ao consumidor final geraram impactos negativos na sociedade. Os gastos familiares nesses itens aumentaram expressivamente e as empresas e trabalhadores do ramo do transporte e dependentes do diesel tiveram suas margens reduzidas em uma economia extremamente fraca.

Foi nesse ambiente que, concomitantemente, a Petrobras iniciou um forte processo de recuperação de suas margens de lucro e a greve dos caminhoneiros teve início. Impossibilitados de repassarem os aumentos diários do diesel para os fretes de transporte, os caminhoneiros decidiram “cruzar os braços”. Com a paralisação do transporte rodoviário de cargas por duas semanas, nossa economia viveu um verdadeiro choque. Falta de combustíveis aos consumidores, escassez de matérias-primas para as indústrias, voos cancelados e alimentos perecíveis perdendo suas validades ilustram alguns exemplos das consequências que essa crise do setor de transporte gerou em nossa sociedade.

 

De onde vieram então os R$ 10 bilhões de lucro líquido da Petrobras, apenas no segundo trimestre de 2018? A origem desse excelente resultado deve-se ao fato de uma gestão mais eficiente, queda do endividamento, desinvestimentos em áreas menos lucrativas e, sobretudo, na nova política de preços. Entretanto, não podemos deixar de associá-la com o estopim da greve dos caminhoneiros e todos seus impactos na vida dos brasileiros.

A Petrobras prejudicou diretamente um de seus maiores clientes: o transporte de cargas rodoviárias. Era de se imaginar que a recuperação da empresa a qualquer custo traria consequências, ainda mais em um período de recuperação lenta da atividade econômica. O preço do diesel ficou insustentável e o setor parou o Brasil por duas semanas. Se olharmos por esse ângulo, percebemos que o caminho adotado deixou sequelas em nossa sociedade, as quais vão demorar para cicatrizar.

Lucas Lautert Dezordi é doutor em Economia, sócio da Valuup Consultoria e professor titular da Universidade Positivo (UP).
O artigo foi publicado no site da Gazeta do Povo 15/08/2018