O relatório de qualidade dos ganhos além do processo de due diligence

Recentemente os vendedores estão buscando esse relatório por conta própria, com o objetivo de se autoavaliar antes de iniciar um processo de venda.

Nos últimos anos, relatórios de qualidade de ganhos (também chamados  Quality of Earnings Report ou QofE) tornaram-se mais populares em negócios de M&A, pois ajudam os compradores a se sentirem mais confortáveis ​​com os números do vendedor e identificam  os riscos do negócio.

Os relatórios QofE são diferentes de uma auditoria embora as demonstrações financeiras auditadas da empresa vendedora sejam um bom ponto de partida. A diferença é que um estudo QofE enfoca o poder dos ganhos econômicos da empresa; afinal, as empresas são normalmente adquiridas pela geração de seus fluxos de caixa futuros. O objetivo do estudo QofE é fornecer garantia de que os ganhos são sustentáveis e serão traduzidos em fluxos de caixa.

Esses relatórios geralmente são elaborados em processos de M&A na fase de due diligence e realizados por uma empresa terceirizada, o que fornece uma análise e revisão das finanças do vendedor e da estrutura do negócio através de uma visão independente: uma vez que a empresa é terceirizada, não tem interesse na transação, sendo, portanto, imparcial e não influenciada por nenhuma pressão entre as partes envolvidas no negócio. 

O relatório analisa a qualidade dos ganhos, isto é, quão sustentáveis ​​são receitas e ganhos e quão realistas são as projeções do vendedor. O escopo do relatório pode variar dependendo das preocupações do comprador e da complexidade do negócio, fazendo com que diversos tópicos possam ser estudados. Por exemplo, se a carteira de clientes do vendedor é, em sua maioria, de empresas consolidadas, se as receitas são baseadas em contratos de longo prazo ou recorrentes, se as receitas aumentam constantemente, esses ganhos geralmente seriam de alta qualidade. No entanto, se os clientes são, em sua maioria, empresas menores, se os pedidos são irregulares, se hámuitos pedidos únicos, se os fornecedores são pequenos, se o imobilizado de produção já está defasado em relação ao mercado e se as receitas aumentam e diminuem constantemente, o relatório, provavelmente, classificaria esses ganhos como de qualidade inferior.

Recentemente os vendedores estão buscando esse relatório por conta própria, com o objetivo de se autoavaliar antes de iniciar um processo de venda. O benefício é que a empresa pode identificar os problemas que diminuem o seu valor e ajustá-los internamente com antecedência, servindo como uma boa ferramenta para tomada de decisão, além de demonstrar profissionalismo na gestão, transmitindo confiança para um eventual comprador. 

A principal diferença entre uma auditoria ou revisão financeira e um relatório QofE pode ser assim estabelecida: as auditorias verificam se as finanças estão em conformidade com as normas contábeis; já os relatórios de QofE levam em consideração os riscos e também cobrem as projeções futuras.

O relatório de QofE não substitui a due diligence completa realizada pelos compradores, mas pode ser uma ferramenta independente muito importante para a compreensão do negócio.

Número de novas Recuperações Judiciais tem menor nível desde 2014

Recuperações Judiciais requeridas chegam a 454 no primeiro semestre de 2021, maior nível apenas que 2014 e 2012 nos últimos dez anos. E micro e pequenas empresas que entraram com o pedido chegam à maior porcentagem dos últimos dez anos, com 69% até junho de 2021.

Sempre é válido analisar o mercado de insolvência a partir do aumento ou queda do número de Recuperações Judiciais (RJs) requeridas. Porém, não achamos a análise imediatista do aumento/queda do número de pedidos de um mês para o outro, ou até mesmo nos últimos 12 meses a melhor forma de olhar para esses números.

É interessante observar a série histórica dos últimos dez anos de RJs requeridas, com diferentes recortes, para melhor entendermos os impactos atuais.

Fonte: Serasa Experian
Elaborado: pela Valuup

O primeiro semestre de 2021 demonstra que as expectativas de um incremento de novas Recuperações Judiciais, espelhando o boom de 2016, aparentemente não vão acontecer. Se há 12 meses falávamos que era o menor nível de RJs do primeiro semestre dos últimos cinco anos, agora estamos vendo o menor número de pedidos dos últimos sete anos, sendo menor, inclusive, que 2013.

Notoriamente, o mercado de insolvência vem ganhando maturidade e robustez com mais de dez anos da modernização da Lei 11.101/2015 e com a sua nova atualização, Lei 14.112/2020. Todavia, essa maturidade não está sendo refletida no aumento de utilização dessa ferramenta para reestruturação empresarial.

Se dermos um “zoom” no gráfico anterior, podemos comparar mês a mês os pedidos:

Fonte: Serasa Experian
Elaborado: pela Valuup

Percebemos que meses, historicamente, com alto número de requisições, como constatados no segundo trimestre do ano, todos com uma média superior a 100 pedidos-mês, 2021 não acompanha a mesma tendência, ficando acima da média apenas em fevereiro.

No entanto, identificando o perfil dos pedidos por segmento encontramos:

Fonte: Serasa Experian
Elaborado: pela Valuup

Interessante que, mesmo encontrando um primeiro semestre com baixa no número de pedidos, observamos que o número de micro e pequenas empresas que requisitaram Recuperação Judicial nunca foi percentualmente tão alto, chegando a 69%. Em contrapartida, nunca foi tão baixo o número de grandes empresas que fizeram os seus pedidos, apenas 10% até então.

Isso claramente mostra o que já podíamos imaginar: que as empresas de micro e pequeno porte são as que estão tendo maior dificuldade de enfrentar os reflexos da pandemia. Além disso, fica evidente que a Recuperação Judicial não é um mecanismo de reestruturação que só grandes empresas utilizam, como normalmente se acredita. Os números demonstram que as micro e pequenas empresas cada vez mais recorrem a ela como meio de reestruturação dos seus passivos.

Recuperação da Economia Brasileira

O desempenho da atividade econômica pode ser analisado pelos fatores da oferta ou demanda agregada. O Gráfico 1 destaca o desempenho do PIB, no acumulado de 12 meses, pelos segmentos da oferta. O PIB registra uma retração de 3,8%, muito influenciado pela recessão recorde do segundo semestre do ano passado, período mais crítico da pandemia. O setor da agropecuária foi destaque positivo, com crescimento de 2,3% anualizado. A forte demanda mundial por grãos, carnes e derivados puxaram as exportações e o segmento. As atividades do comércio e indústria tiveram um desempenho melhor do que o PIB, beneficiando-se do avanço do e-commerce e dos preços internacionais das commodities: minério de ferro (aço), petróleo e madeira, por exemplo. A indústria extrativa foi destaque positivo no início do ano, com ampliação da produção e dos investimentos.

 
Fonte: IBGE, Contas Nacionais Trimestrais.
Fonte: IBGE, Contas Nacionais Trimestrais.

Nos trimestres anteriores à pandemia, o PIB da construção mostrava baixo dinamismo e, por esse motivo, em 12 meses a atividade está em queda de 6,9%. Porém, cabe destacar que o setor está se recuperando, com crescimento no 1ºT/2021 na ordem de 2,1% em relação ao trimestre imediatamente anterior (Gráfico 3). O setor de serviços com queda de 4,5% anualizada e representando cerca de 60% do PIB foi severamente afetado pelas restrições de mobilidade social e do elevado desemprego do trabalho informal. Dessa forma, uma recuperação mais robusta da economia brasileira passa necessariamente pelo avanço no processo de vacinação. Com isso, esperamos uma retomada mais consistente do setor de serviços nos próximos trimestres, em especial durante o segundo semestre (Gráfico 4).

Pela ótica da demanda, o destaque positivo em 12 meses está na formação bruta de capital fixo, com avanço de 2,0%. O volume de investimento no 1º trimestre em relação ao trimestre imediatamente anterior cresceu 4,6% (Gráfico 3), indicando um maior gasto das empresas na compra de novas máquinas e equipamentos. As exportações caíram pouco durante a pandemia em virtude da forte valorização das commoditiese indicam um crescimento no trimestre de 3,7%. O consumo das famílias representa 60% do PIB e sua queda de 5,7% em 12 meses (Gráfico 2) dificulta o registro de uma retomada mais robusta. Os dados do 1º trimestre de 2021 mostram uma estabilidade no consumo, e o maior desafio da economia consiste em estimular esse crescimento, com uma maior recuperação no mercado de trabalho e na renda real. 

 
          Fonte: IBGE, Contas Nacionais Trimestrais.

Os fortes dados dos investimentos nas empresas mostram que o PIB, no 1º trimestre, foi puxado por fatores da oferta agregada. Dados divulgados pelo IBGE demonstram que o nível dos estoques (matérias-primas, produtos em elaboração ou acabados) foi de R$ 83,9 bilhões, representando 4,1% do PIB. Foi um maior nível percentual da série histórica das contas nacionais. Variações positivas nos estoques indicam uma recuperação econômica. Por exemplo, em 2010, quando o PIB cresceu 7,5%, a variação positiva nos estoques atingiu cerca de 1,3% do PIB, mas com forte crescimento no consumo das famílias.

Valuup - Mercado de M&A segue com tendência de alta

Mercado de M&A segue com tendência de alta

Números acumulados até maio de 2021 já superam todo o ano de 2020

Seguindo a tendência do primeiro trimestre conforme o artigo M&A – 1º trimestre faz ano de 2021 começar com recordes, o acumulado das transações continuou com movimento de alta nos meses seguintes, superando os números de antes da crise de 2020, ano em que estas tiveram um período de pouca movimentação devido às inseguranças do mercado. Segundo a pesquisa Panorama de M&A no Brasil 2021 (Deloitte), a demora na compra de vacinas e as incertezas políticas no meio da crise sanitária e econômica que atingiu o mundo em 2020 fizeram com que o Brasil registrasse uma recuperação mais lenta.

Porém, a pandemia fez com que as empresas mais afetadas pela crise se tornassem atrativas para grupos capitalizados que buscam ganhar mercado pela compra de concorrentes ou que então buscam a diversificação de seus negócios. Até maio de 2021, o volume de transações atingiu a marca de 693, alta de 37,23% sobre o mesmo período do ano passado, e 20,3% acima de janeiro a maio de 2019, segunda a TTR (Transactional Track Record). 

Em valores, as operações atingiram R$ 221,6 bilhões, alta de 334,50% sobre igual período do ano passado, e 83% acima de 2019. A TTR inclui em suas estatísticas transações que não envolvem, necessariamente, assessores financeiros na intermediação. 

Segundo a consultoria Dealogic, que coleta dados do mercado financeiro, já foram realizadas neste ano, até o momento, 237 operações de fusões e aquisições no Brasil no valor de US$ 52,1 bilhões, superando o valor de todo o ano passado, que foi de US$ 45,9 bilhões em 185 transações. 

Os dados da pesquisa Panorama de M&A no Brasil 2021 (Deloitte) também apontam que o país deve continuar se destacando no mercado mundial de fusões e aquisições. Dos 100 executivos de empresas brasileiras entrevistados para a pesquisa, 71% estão buscando oportunidades para crescer de forma inorgânica enquanto 95% do total prevê que a atividade de M&A, em 2021, deve ser maior ou igual à reportada em 2020. Além disso, 64% dos executivos afirmaram também que estão buscando oportunidades de investimentos em fusões e aquisições no Brasil.

Com o cenário de juros em baixa e maior liquidez, o movimento de consolidação de empresas nacionais ganha força e, num outro movimento, o câmbio atrativo torna os ativos mais baratos para as empresas estrangeiras, estimulando a sua entrada no mercado nacional, apesar das incertezas econômicas e políticas que fazem esse investidor ficar mais receoso. Tais motivos nos levam a crer que o ano de 2021 ainda promete quebrar mais recordes no mercado de M&A.

2ª Fase da Reforma Tributária e seus impactos nas corporações

O governo federal entregou, na última sexta-feira (25/06), ao Congresso uma nova etapa da Reforma Tributária. O texto da segunda fase abordará os seguintes temas para as pessoas jurídicas (PJ):

  1. redução da alíquota do imposto de renda pessoa jurídica (IRPJ) de 25% para 22,5% em 2022 e de 20% a partir de 2023;
  2. o fim do benefício fiscal gerado pelo pagamento de juros sobre o capital próprio (JCP); e
  3. criação de um novo imposto de 20% sobre os dividendos.

Os analistas do BTG realizaram um exercício com 150 empresas brasileiras sob cobertura do Banco. Assumiram que as empresas não mudarão seus pagamentos de dividendos atuais e que a proposta enviada ao Congresso não sofra modificações (normalmente o texto é modificado pelo Legislativo). O gráfico a seguir mostra os setores mais afetados.

Fonte: BTG Pactual, Brazil Strategy, 28 June 2021, p. 4. Modificado.

As empresas que pagam muito JCP irão sofrer mais, com uma perda de lucro de cerca de 5% a 9%. São empresas dos setores de Alimentação & Bebida, Telecomunicação, Bancos e Mineração & Siderurgia.

Por sua vez, as empresas dos setores de Infraestrutura, Aluguel de Automóveis, Bens de Capital, Petróleo & Gás e Agronegócio tendem a aumentar seus rendimentos entre 6% a 8% em 2023. São empresas que não pagam JCP e se beneficiarão da redução da alíquota do IRPJ.

Contudo, todas as empresas serão afetadas pela criação do novo imposto de 20% dobre os dividendos. Atualmente, a Receita Federal não tributa distribuição de lucros. Com esse novo imposto, as empresas de grande porte terão maior incentivo fiscal para reinvestir e ampliar seu apetite por aquisições de novos negócios. É uma forma de ampliar a poupança doméstica da economia e expandir a formação de capital, ou seja, o crescimento econômico.

Ampliar a tributação sobre o lucro distribuído é uma forma de equilibrar o sistema tributário entre a renda do trabalho com a do acionista. Contudo, a grande desigualdade social gerada pela tributação regressiva no Brasil encontra-se sobre os impostos indiretos. Ou seja, enquanto não avançarmos em uma redução expressiva dos tributos sobre bens e serviços, nosso sistema tributário continuará infringido o Princípio da Equidade das finanças públicas.


Plano ABC+ e incentivo à agricultura sustentável

Como o governo pretende estimular a preservação ambiental

O Plano ABC “original” esteve vigente entre 2010 e 2020 e tinha, como principal objetivo, reduzir as emissões de gases de efeito estufa na agricultura (respeitando acordos climáticos internacionais), ao mesmo tempo em que visava ampliar a produção agrícola sob bases sustentáveis até 2020. Para isso, o plano foi dividido em sete programas de mitigação e adaptação das práticas agrícolas às mudanças climáticas.

O financiamento dos programas contidos no Plano era feito por meio de linhas de crédito e recursos orçamentários. Uma linha de crédito específica para atender às demandas do plano foi lançada pelo BNDES, o Programa ABC. Outros programas concorreram com o mesmo objetivo:

  • Moderagro;
  • Inovagro;
  • Pronaf; e
  • Pronamp.

A taxa de juros variava entre 4,5% a 6% a.a., o que representa um custo bastante interessante aos produtores rurais. A concessão do crédito foi intermediada por meio de bancos comerciais e exige a apresentação de um Projeto Técnico passível de avaliação, devendo ser elaborado de modo a permitir o enquadramento dos itens financiáveis aos objetivos do Plano ABC. Todavia, o Projeto Técnico não exigia um estudo de viabilidade econômico-financeira e estudo de impactos sociais, o que, em nossa opinião, enfraquece o programa.

O “face lifting” do plano veio em 2021, com o objetivo de renovar o Plano ABC até 2030. Denominado Plano ABC+, a nova versão introduziu instrumentos indutores transversais de comercialização de créditos de redução de emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE). O novo programa mantém os estímulos da versão anterior, com a promessa de introdução de melhorias na governança e nas estratégias de avaliação do plano em comparação com o plano ABC original.

Por enquanto, somente foram divulgadas algumas intenções do ABC+; não foram detalhados os programas desse novo plano, nem suas metas, nem seus instrumentos e incentivos econômicos. Todos os detalhes devem ser esclarecidos com a divulgação do Plano Operacional do ABC+ no segundo semestre de 2021.

Nossos estudos revelam que o Plano ABC+ é um importante instrumento de financiamento para o produtor rural; entretanto, ao menos dois pontos nos chamam atenção:

1) a importância de estudos de cunho econômico-financeiro e de impactos sociais das ações financiadas;

2) a mensuração dos retornos à sociedade e dos impactos ambientais.

Vamos aguardar o segundo semestre de 2021 para avaliar como os agentes econômicos irão ofertar os programas relacionados ao Plano ABC+.

Fatores de risco inflacionário

A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), na última reunião, em aumentar a taxa básica de juros da economia de 2,75% para 3,50% está alinhada com as estimativas de mercado e dentro de um cronograma de normalização da política monetária com o atual processo inflacionário. Ou seja, um movimento correto e necessário para sinalizar o compromisso do Banco Central (BC) com a estabilidade de preços. É claro que o aumento dos juros não é desejado, ainda mais em um período de recuperação de nossa economia. Contudo, a inflação mais alta e persistente prejudica a renda do trabalhador e a capacidade produtiva ao longo do tempo. Será pior para a economia como um todo.

Em linhas gerais, podemos destacar três fatores de riscos inflacionários. O primeiro deles é mundial. A forte recuperação das economias desenvolvidas alinhadas com expansões fiscais e monetárias sem precedentes, alimentam a forte demanda internacional por grãos, proteínas, celulose, minérios, puxando os preços internacionais dos insumos básicos. Por exemplo, nos EUA, onde a vacinação está avançando rapidamente, os preços no setor manufatureiro do Instituto de Gestão de Fornecimento (ISM) aumentaram 37% entre dezembro de 2020 e maio de 2021, indicando um maior risco para a inflação. Mesmo com um mercado de trabalho ocioso, esse risco no curto prazo poderá pressionar os juros internacionais para cima, dificultando o controle de preços doméstico.

O segundo fator refere-se à evolução das finanças públicas. Em recente Relatório de Inflação (março), o BC projeta um cenário alternativo de maior risco fiscal, com deterioração das contas públicas e dificuldade no avanço das reformas. Utilizou como referência a recente crise fiscal iniciada em 2014, a qual gerou uma maior percepção internacional de default nas principais agências de risco. Com efeito, a economia brasileira apresentou uma depreciação cambial, contribuindo para a elevação dos preços domésticos.

A Autoridade Monetária apresenta um cenário de inflação preocupante decorrente do aumento do risco fiscal. O descolamento das projeções inicia no quarto trimestre de 2021 e atinge um ápice no terceiro trimestre de 2022, com uma inflação de 5,7% para este ano e 5,9% para o próximo. O mais importante desse exercício é esclarecer que a deterioração das contas públicas afetará a dinâmica de médio e longo prazos da inflação, contaminando as expectativas dos agentes de mercado.

Por último, o risco da inflação inercial se intensifica com o aumento das expectativas de inflação, reportadas no Relatório Focus. Os analistas esperam um IPCA para 2021 em cerca de 5,2%, isto é, no limite superior à meta de inflação. Para 2022, o mercado espera uma inflação um pouco acima da meta de 3,50%. Alguns fatores recentes estão alimentando a alta nas expectativas. As condições climáticas de maior estiagem aumentam as projeções de preços de energia e alimentação. Alguns analistas estão considerando bandeira tarifária vermelha 1 para dezembro; e revisão para cima em suas projeções de alimentação no domicílio, com aumento nos preços de grãos e cereais – componentes relevantes na composição do IPCA.

Com isso, os maiores riscos inflacionários mundiais e nacionais prescrevem uma atuação mais conservadora do Copom, o qual tem como objetivo principal manter as expectativas de inflação de curto e médio prazos do mercado ancoradas às metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Reforço que, com inflação sob controle e reformas importantes do estado brasileiro, teremos uma capacidade de crescimento de longo prazo mais vigorosa em nossa economia.

*Lucas Lautert Dezordi, é doutor em Economia, sócio da Valuup Consultoria, economista-chefe da TM3 Capital e professor da Universidade Positivo.

*Artigo publicado na Gazeta do Povo em 10/05/2021

Panorama e perspectivas no setor de Shopping Centers

A Associação Brasileira de Shopping Centers projeta um crescimento de 9,5% para 2021

Talvez um dos setores mais atingidos pelas restrições impostas para conter a disseminação da Covid-19 seja o dos shopping centers. Essa atividade, que dependia quase que exclusivamente do fluxo de pessoas que visitavam seus corredores diariamente, viu todas as operações do país suspenderem as atividades em abril de 2020, sendo o mês mais impactado pelo coronavírus, até então, com queda de faturamento em 89% – conforme dados da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce) – quando comparado com o mesmo mês do ano anterior.

Segundo a Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop), as visitas mensais aos shopping centers caíram de 502 milhões de pessoas em 2019 para 341 milhões no ano passado representando uma queda de 32%. Outros estudos também confirmam essa redução, como o Índice de Performance do Varejo (IPV), realizado pela FX Data Intelligence, o qual demonstra que, em 2020, a frequência de pessoas ficou 27,71% menor que em 2019. O IPV ainda traz dados referentes a lojas de ruas, em que a queda foi de apenas 2%, evidenciando que os efeitos mais duros foram sofridos pelos shoppings.

O tempo de permanência dentro dos centros de compras também foi reduzido, de uma hora e meia, em 2019, para uma média de 30 minutos ao longo de 2020, segundo pesquisa da Alshop. Esse dado vai ao encontro da percepção da Abrasce quanto a uma mudança de comportamento, em razão do medo da contaminação pelo coronavírus, que fez com que os visitantes passassem a ir com menos frequência aos shoppings tornando suas compras mais assertivas. A queda de circulação teve reflexo direto na receita nominal do setor que, de acordo com a Abrasce, registrou, em 2020, um faturamento de R$ 128,8 bilhões, uma queda de 33,2% em relação a 2019, quando o faturamento foi de R$ 192,8 bilhões.

Com o espaço físico sofrendo restrições de circulação, foram observadas nos players do mercado diversas ações, como redução dos custos condominiais e flexibilização das condições para faturamento de aluguéis, para amenizar o impacto que os lojistas tiveram e continuam tendo. Muitos desses lojistas também necessitaram buscar outros meios de receita, como o delivery e o drive-thru.

Segundo dados da Abrasce, no final de 2020 o número de empreendimentos com aplicativos já correspondia a 41%, demonstrando a já conhecida tendência de aceleração digital provocada pela pandemia (de diversos estudos, podemos citar o Análise do Comportamento de Consumo, publicado pelo Itaú em 9 de fevereiro de 2021; este relata que as compras digitais chegaram a crescer 29% no ano passado). Além dos lojistas, os shoppings buscaram desenvolver seus próprios marketplaces, sendo que, em 2020, 29% deles já operacionalizavam por esse canal, ante apenas 11% em 2019. A pesquisa ainda afirma que 59% dos shoppings pretendem implementar uma plataforma de marketplace nos próximos dois anos.

Apesar do impacto financeiro, sete shoppings foram inaugurados em 2020, somando-se aos 594 já em operação. O número de lojas também cresceu e chegou a 110 mil, uma alta de 5% na comparação com 2019. Houve, ainda, um crescimento de 2,8% no número de salas de cinemas, totalizando 2.982 unidades. Já a vacância ficou em 9,3% em 2020, contra 4,7% no ano anterior. No total, 7% dos shoppings passaram por algum tipo de expansão. Para os próximos anos, 26% dos empreendimentos pretendem expandir – número expressivo se considerarmos que, em 2019, apenas 10% dos shoppings tinham planos de ampliação.

Para 2021, está prevista a inauguração de 13 shoppings que, juntos, somam uma ABL de 278.227 m². O destaque fica por conta do Estado do Paraná que conta com quatro lançamentos e 127.200 m² de ABL, colocando o estado na 4ª posição em se tratando de ABL – ficando atrás apenas de São Paulo (1ª), Rio de Janeiro (2ª) e Minas Gerais (3ª).

Para 2021, a Abrasce projeta um crescimento de 9,5% baseado no cenário atual. A instituição acredita que a imunização da população é fundamental para a recuperação econômica. Em vista disso, a associação enviou uma carta aos prefeitos dos 222 municípios, onde há shoppings no Brasil, e aos governadores, colocando o setor à disposição para auxiliar no processo de vacinação da população. 

Valuup aprova Plano de Recuperação Judicial do Hospital XV e do Instituto de Medicina do Paraná

No último dia 13 de abril de 2021, nós, da Valuup, conseguimos aprovação do Plano de Recuperação Judicial do Hospital XV e do Instituto de Medicina do Paraná, com 72,44% dos credores presentes e 77,51% do total dos créditos presentes, e com percentuais por classificação legal conforme gráficos a seguir:

A Recuperação Judicial (RJ) dos hospitais foi solicitada e deferida no final de agosto de 2019. A Valuup foi contratada, no início de 2020, por indicação do parceiro jurídico que assumia o caso, a AFI – Advocacia Felippe e Isfer.

A RJ contava, em sua consolidação, com 588 credores, distribuídos em três classes legais: 66% credores trabalhistas, 16% credores quirografários (“que não de regalias ou prioridades em relação aos outros”) e 17% credores micro ou pequena empresa. 

Como forte característica do negócio, intensivo em mão de obra, foi necessária uma forte negociação com os credores trabalhistas que estavam pulverizados em diversos advogados e representes legais. Juntos, os credores trabalhistas totalizavam mais de 16 milhões de reais.

As demais classes totalizavam mais de 9 milhões de reais, sendo 7 milhões credores quirografários e 2 milhões credores micro e pequena empresa.

O plano aprovado reperfilou 25 milhões de reais em dívidas sujeitas, com deságios que chegam a 50% do valor original, com até 24 meses de carência e mais de sete anos para pagamento de principal e juros.

As criptomoedas são ativos intangíveis?

Como devem ser registradas e amortizadas as criptomoedas

Vem se tornando cada vez mais comum o uso das criptomoedas entre as pessoas e, consequentemente, pelas empresas também. Este artigo foi inspirado na matéria publicada no Valor Econômico em 18/02/21. No texto de Muriel Waksman, advogada e sócia da Tognetti Advocacia, há alguns questionamentos que nos chamaram atenção:

  • Como funciona o registro contábil das criptomoedas no capital social de empresas?
  • Seria um ativo intangível?
  • Sofreria impairment?

O artigo aborda a integralização de capital de empresas por meio de criptomoedas. Conforme o Ofício-Circular SEI nº 4081/2020/ME, divulgado pelo Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI), o reconhecimento de criptomoedas como forma de integralização de capital social é válido, e o ofício norteia as Juntas Comerciais de todo o país em favor dessa validade.  

Respondendo aos questionamentos da Dra. Muriel, do ponto de vista estritamente contábil, nosso entendimento é de que as criptomoedas devem ser classificadas como ativos intangíveis.

O reconhecimento de um ativo como intangível deve atender às seguintes características conforme preconizado pelo CPC-4 (Comitê de Pronunciamentos Contábeis):

1. Definição de ativo intangível

  • Ser não monetário
  • Ser identificável
  • Não possuir substância física

2. Critérios de reconhecimento

  • Provável geração de benefícios futuros
  • Custo mensurado com confiabilidade

A grande questão aqui é se há benefícios futuros. Por si só, uma criptomoeda não gera caixa futuro, no sentido amplo. No entanto, como meio de transações financeiras, poderia atender parcialmente a esse quesito. Quanto à mensuração, há cotações disponíveis em tempo real no mercado.

E as criptomoedas devem sofrer impairment? Bem, trata-se de um ativo intangível com vida útil indefinida. Por esse critério, uma empresa deve avaliar anualmente se há perda relevante do ativo; porém, esse tipo de ativo, de vida útil indefinida, não sofre impairment, sendo ajustado somente na liquidação do ativo.

Portanto, o registro inicial na integralização de capital segue o mesmo caminho dos demais ativos: lançamento de valor no capital social da empresa em contrapartida ao ativo intangível. A diferença oriunda do uso da criptomoeda, na sua liquidação, entendido como a diferença do valor aportado como integralização e o valor na data, assim como os demais ativos, serão levados ao resultado do exercício da empresa.