Perspectivas para a Economia Brasileira e Mundial: 2021

A sustentabilidade da recuperação da atividade econômica 

A economia mundial entrou em recessão severa no primeiro semestre de 2020. O distanciamento social, em virtude do avanço da pandemia, gerou quedas expressivas na atividade produtiva. O Gráfico 1 descreve o desempenho do PIB (Produto Interno Bruto) em países selecionados, tendo como base de referência o nível de atividade no 4º trimestre de 2019 (pré-Covid). Pelo fato de o início da pandemia ter ocorrido na China, sua economia sofreu de forma mais severa no 1º trimestre, recuperando-se surpreendentemente no período seguinte enquanto a economia global desabava. A retração econômica na Índia e no México foi de 25% e 17%, respectivamente, em apenas um trimestre. Nesse mesmo período, a economia brasileira seguiu a tendência dos EUA e Europa, com queda de cerca de 10% do PIB.


Fonte: OECD (2020), Quarterly GDP (indicator).

É importante destacar que a economia chinesa está um passo à frente dos movimentos econômicos da pandemia. E, apesar de ela ter subido exatamente no 2º trimestre, seu nível de atividade produtiva ficou relativamente estagnado no 3º trimestre. Durante o processo de recuperação, o Banco Popular da China identificou que as famílias, as quais sofreram com a perda da renda, terão uma maior propensão a poupar e, com isso, estão encontrando uma maior dificuldade para expandir o consumo das famílias e investimentos das empresas. Ou seja, uma recuperação mais plena da economia mundial dependerá, certamente, de novos estímulos econômicos, em especial o fiscal.

Essa recuperação dependerá do avanço de um amplo programa de vacinação aliado aos pacotes fiscais. O presidente eleito dos EUA, Joe Biden, sinalizou para o avanço nessa estratégia. As discussões no Congresso e Senado dos EUA indicam, em uma etapa inicial, um pacote fiscal para o início de 2021 na ordem de US$ 908 bilhões. Seus recursos estariam direcionados para um Pacote de Proteção ao Salário (30%), seguro-desemprego adicional, incluindo US$ 300 semanais até março (20%), ajuda a governos estaduais (18%), distribuição de vacinas (2%), suporte às companhias aéreas (2%) e demais programas (28%).

Paralelamente ao pacote norte-americano, é fundamental acompanharmos a relação EUA-China no cenário internacional. Entendemos que uma ação conjunta das duas maiores economias pode ajudar na recuperação mundial. Em especial, nossa atenção está voltada para o anúncio de estímulos fiscais da economia chinesa quando o País passar a anunciar uma maior meta de déficit fiscal para 2021. Atualmente o déficit público está em cerca de 3,6% do PIB. Espera-se um anúncio de déficit para o próximo ano de pelo menos 1 ponto percentual do PIB. Apesar de o consumo e exportações terem apresentado forte recuperação no terceiro trimestre de 2020, há uma preocupação em relação aos investimentos em infraestrutura e manutenção na geração de emprego de qualidade para sustentar o consumo das famílias.

A tabela a seguir destaca as perspectivas de crescimento mundial do PIB para 2020 e 2021 conforme projeções do FMI (Fundo Monetário Internacional). Um crescimento de 5,2% para a economia mundial em 2021, com destaque positivo para os mercados emergentes (6,0%).


Fonte: FMI, projeções de outubro.

Entretanto, mesmo com o avanço dos pacotes fiscais nos EUA e China, as perspectivas para nossa economia são de retomada mais moderada. Segundo o Relatório Focus, de 4 de dezembro de 2020, o mercado espera uma expansão do PIB de apenas 3,50%. Isto é, abaixo da retomada dos países emergentes. Cabe ressaltar que o atual processo inflacionário de alimentos tende a se dissipar ao longo do primeiro semestre de 2021, com uma taxa de câmbio mais próxima de R$ 5,00 por dólar. O IPCA deve ficar entre 3,40%, com uma maior pressão de preços administrados, em especial nos setores de energia, combustíveis, transportes públicos e saneamento.

A notícia boa é que nossa economia vai avançar em seu processo de recuperação, mas tudo indica que em um ritmo inferior aos dos países emergentes.

Fatores de sucesso para processo de M&A

Integração e complementariedade de operações é fundamental para o êxito em operações de Fusões e Aquisições

Os processos de Fusões e Aquisições são carregados de incertezas e uma infinidade de condicionantes para determinar o sucesso ou insucesso delas.

Uma parte significativa desses condicionantes estão alicerçados em aspectos subjetivos e cognitivos na tomada de decisão. Os aspectos subjetivos são aqueles que comprador ou vendedor de empresas esperaria que acontecesse em condições normais de mercado, o que, na prática, nem sempre acontece. Os aspectos cognitivos estão baseados em tomada de decisões, aspectos mentais e de comportamento de compradores e vendedores de empresas, abrangendo uma vastidão de possibilidades.

Cartwright e Schoenberg (2006) avaliaram operações de M&A e concluíram que:

· 56% das operações de M&A não atingiram o objetivo original pretendido;

· Quase sempre o processo produziu um estresse cultural (na relação entre empresa vendida e compradora);

· 70% dos executivos sairam da empresa no período de 5 anos;

· Metade das aquisições não tem retorno positivo nos primeiros 5 anos;

· 35-45% tem algum tipo de retorno positivo entre 2-3 anos;

· A taxa de insucesso mundial é de 44-45%

Esses são alguns dos achados desse ótimo artigo sobre as operações de M&A. Na verdade, acertar na compra de uma empresa é tão certo quanto jogar uma moeda.

Os mesmos autores então perguntaram quais aspectos estão relacionados ao sucesso das operações de Fusões e Aquisições, cabendo destacar:

1. A integração estratégica entre as empresas;

2. O próprio processo de aquisição (condução);

3. Os aspectos culturais das empresas e aspectos humanos (dos empregados envolvidos), destacando a importância de uma comunicação clara e transparente;

4. E o ajuste do negócio da empresa alvo com a empresa compradora: compartilhamento de recursos e transferência de conhecimento

Em um artigo mais antigo, Larsson e Finkelstein (1999) apontaram como fatores de sucesso, o que de certa maneira corrobora com os achados de Cartwright e Schoenberg (2006), os seguintes aspectos:

1. Complementariedade de operações das empresas;

2. Alta integração das organizações;

3. E destacaram que produtos e marketing similares entre as empresas tendem a dificultar a operação.

Tomar decisões com base na estratégia da empresa compradora, atentando para a integração e complementariedade, com uma comunicação clara e transparentes entre os agentes, aliado ao compartilhamento de recursos e transferência de conhecimento são os fatores chaves para o sucesso do processo de aquisição.

Mas nem sempre é o que observamos em processos de M&A. Em muitos casos a operação adquirida (empresa) acaba sendo renegada a segundo plano, por vezes até descontinuada. Os empregados e executivos passam por grande estresse, que acaba levando a perda de times de trabalho e de clientes.

CARTWRIGHT, Susan; SCHOENBERG, Richard. Thirty years of mergers and acquisitions research: Recent advances and future opportunities. British Journal of Management, v. 17, n. S1, p. S1-S5, 2006.

LARSSON, Rikard; FINKELSTEIN, Sydney. Integrating strategic, organizational, and human resource perspectives on mergers and acquisitions: A case survey of synergy realization. Organization science, v. 10, n. 1, p. 1-26, 1999.

Inflação dos Alimentos no Cenário Atual

A inflação do mês de setembro, no valor de 0,64%, ficou acima das expectativas. Em 12 meses, o IPCA acumulou uma alta de 3,14% e, no ano, 1,34%. O grupo que mais influenciou esse aumento foi alimentação no domicílio, com uma valorização de 9,17% no ano. A forte demanda internacional por commodities, em especial alimentos, vem pressionando alguns itens essenciais no consumo das famílias. A tabela a seguir destaca que óleo de soja (+51,29%), arroz (+40,67%), feijão (+34,48%) e leite longa vida (+30,39%) tiveram aumentos expressivos. Em paralelo, as exportações físicas de alimentos no acumulado de janeiro a setembro de 2020, em relação ao mesmo período do ano anterior, aumentaram significativamente, com arroz sem casca (+28,1%), soja (+30,3%), leite, creme de leite e laticínios (+24,1%). De fato, o avanço das exportações físicas e a forte valorização do dólar ampliaram o repasse de preços desses itens ao consumidor final, mesmo em um ambiente de recessão econômica.

Fontes: IBGE e Secretaria do Comércio Exterior.

Outra fonte de inflação preocupante para os índices de preços são os bens industriais, principalmente em virtude da valorização do minério de ferro no mercado internacional. As exportações de ferro-gusa, pó de ferro ou aço e ferro-ligas aumentaram em 32,7% entre janeiro a setembro de 2020 em relação ao mesmo período do ano anterior. A falta de insumos na área industrial e embalagens estão dificultando a retomada da atividade produtiva. Contudo, em nosso cenário de referência esse choque é temporário, mas entender e acompanhar sua evolução é fundamental. Cabe destacar que maiores riscos inflacionários derivados de novas depreciações no Real podem alimentar o processo de reajustes de preços e prejudicar a manutenção da taxa de juros em patamares historicamente baixos. Dessa forma, a manutenção de uma Selic em níveis de aproximadamente 2,0% ao ano pode estar ameaçada caso ocorra uma contaminação da atual pressão de preços nas expectativas de inflação de longo prazo.

O gráfico a seguir descreve o forte aumento nas expectativas de inflação para o final de 2020 e sua influência na dinâmica do mercado de juros futuros DI, em especial nos contratos com vencimento em janeiro de 2023. Torna-se fundamental acompanhar e analisar os impactos de uma inflação maior no curto prazo na curva de juros futuros, pois uma maior pressão nos preços domésticos, aliada a uma taxa de câmbio desvalorizada, pode pressionar os juros de nossa economia gerando um maior desafio para o processo de reequilíbrio das contas públicas a partir de 2021.


Fontes: B3 e Focus/BCB.

Dicas sobre gestão de caixa em empresas em crise

O período de pandemia trouxe mudanças na nossa sociedade, as preferências do consumidor mudaram e, sobretudo, a cabeça do empresário. Majoritariamente, os negócios tiveram uma queda de faturamento durante essa fase, o caixa virou o grande vilão ou herói das empresas e a necessidade de uma gestão de caixa mais efetiva foi evidenciada.

Durante o evento online, realizado pela Valuup no dia 01 de abril de 2020, que reuniu cerca de 200 pessoas, todos foram questionados sobre as dificuldades enfrentadas neste período de crise, e uma das perguntas foi: O caixa da sua empresa sustentaria sua operação por quantos meses?

 O resultado da pesquisa surpreende quando se analisa que quase metade dos respondentes (44%) diz que teria caixa para apenas dois meses.

Agora que o pior da turbulência passou, é necessário que as empresas, independentemente do tamanho, comecem a olhar com outros olhos para o caixa, por isso vamos trazer algumas dicas para melhora da posição do caixa: sugerimos dividir em duas fases, sendo o primeiro momento considerando aumento e salvaguarda do caixa e, no segundo, tornando o caixa sustentável.

1ª Fase – Aumento e salvaguarda de caixa

Para pensar e desenvolver as projeções de caixa, propomos a criação de um comitê de caixa e indicamos que seja composto pelos gestores das áreas a seguir:

  • Administrativo/Operações;
  • Financeiro;
  • Compras;
  • Vendas.

Aconselhamos que esse comitê, a partir de então, reúna-se semanalmente para discussões, acompanhamento e aperfeiçoamento da gestão do caixa.

Apontamos como essencial, para dar início a esse processo, que cada área levante, no mínimo, os seguintes pontos (ideal que seja feito reunião de imersão e que as discussões não levem mais do que uma semana):

  1. Operações/Administrativo
    • Programação de produção
    • Fornecedores indiretos
    • Níveis de estoques
    • Ativos não essenciais
  2. Financeiro
    • Fluxo de caixa (histórico e projeções)
    • Processos e controles do financeiro
    • Posição das contas correntes e limites disponíveis
    • Capital de giro e nível de endividamento
  3. Compras
    • Principais fornecedores categorizados
    • Fornecedores substitutos
    • Processo de compras e controles
  4. Vendas
    • Principais clientes categorizados
    • Formas de pagamento
    • Processos de vendas e controles

É importante que o comitê gestor do caixa defina as projeções conjuntamente; sugerimos que trabalhe com um horizonte de três meses, com visão diária, semanal e mensal, em que indicamos uma estrutura simplificada como o exemplo a seguir:

                Saldo Inicial

(+)          Entradas Operacionais

(-)           Saídas Operacionais

(=)          Saldo Operacional de Caixa

(+)          Entradas não operacionais

(-)           Saídas não operacionais

(=)          Saldo não operacional

                Saldo Final

Além de discussão e construção das projeções, receitamos que esse comitê seja responsável por:

  1. Controles centralizados de novas compras e novas vendas;
  2. Acompanhamento dos indicadores de caixa;
  3. Plano de ações semanais de geração e preservação de caixa;
    • O resultado de cada ação semanal é apresentado na reunião seguinte com os devidos indicadores de desempenho da ação.
  4. Controle do previsto x realizado.

Cada empresa tem suas especificidades; porém, podemos listar dez pontos a serem abordados por todas as empresas para estabilização do caixa:

  1. Ajustes de prazos do contas a pagar e contas a receber (quanto menor for a diferença entre pagamento e recebimento melhor);
  2. Redução do preço de venda para liquidação e estoques obsoletos;
  3. Venda de ativos não essenciais;
  4. Levantamento e criação de fornecedores alternativos;
  5. Refinanciamento de dívidas;
  6. Estratégia de cobrança de créditos inadimplidos;
  7. Revisão dos controles de créditos para clientes;
  8. Estudo da rentabilidade dos produtos (preferencialmente por cliente) e, consequentemente, definição da não continuidade dos não rentáveis;
  9. Pausa nos investimentos nessas 13 semanas da 1ª Fase;
  10. Envolver a empresa como um todo no processo de cultura do caixa.

Ao fim das 13 semanas e depois de trabalhar os pontos levantados, entramos na 2ª Fase.

2ª Fase – Caixa sustentável

Sugerimos que o comitê de caixa continue a se reunir semanalmente. No entanto, uma vez que todos já estão envolvidos no processo e a cultura do caixa já está instalada, agora o comitê vai passar a manter o acompanhamento dos novos processos e controles trazidos. Vai começar a discutir as questões de maneira menos imediatista, a considerar o médio e longo prazo e  a pensar sobre o que é necessário para a melhora da empresa como um todo, analisando as ações futuras no ponto de vista do caixa, continuando a manter o horizonte projetivo para o acompanhamento do previsto  x  realizado.

Outra dica que podemos deixar é a remuneração/incentivo dos gestores pela geração de caixa e não por outras métricas.

O que podemos observar é que empresas que conseguem percorrer esse caminho se tornam empresas muito mais seguras e perenes. Afinal, as empresas quebram e entram em crise por falta de caixa. Se você e/ou sua empresa quiserem ajuda para o desenvolvimento desse processo, a equipe da Valuup poderá ajudá-lo.

Impairment Test do setor de Tecnologia da Informação

Empresas do setor fazem testes e não identificam a necessidade de reconhecimento de perda

Nos primeiros meses da pandemia, imaginávamos que haveria uma grande demanda por trabalhos de impairment test de ativo imobilizado e intangível, bem como fair value da carteira de recebíveis, covenants e, em alguns casos, going concern para as empresas. Todavia, não foi o que se confirmou nos meses subsequentes.

Os efeitos financeiros ocasionados pela Covid-19, obrigando as empresas a estimar, reconhecer e registrar perdas oriundas do impacto da pandemia nos negócios, parecem ter sido mitigados e causado, até o momento, baixo impacto nos três setores que analisamos: Viagens e Lazer, Varejo e agora Tecnologia da Informação (TI).

Em março desse ano, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) destacou “a importância de as companhias abertas e seus auditores independentes considerarem cuidadosamente os impactos da Covid-19 em seus negócios e reportarem nas demonstrações financeiras os principais riscos e incertezas.” No mesmo comunicado, a CVM menciona que não deveriam ser realizados ajustes que fossem revertidos num breve espaço de tempo.

Para esse artigo, selecionamos o setor de TI conforme Classificação Setorial das Empresas Negociadas na B3, disponível no seu site. Analisamos as notas explicativas com o objetivo de constatar a existência de Nota específica para o    evento Covid-19, suas razões e se houve ou não registro de perda por impairment realizado pelas empresas, de acordo com a tabela a seguir:

Fontes:

As DFs foram disponibilizadas pelas empresas em www.b3.com.br, acessadas em 16/10/20, ou no site das próprias empresas.

Constatamos que todas as empresas do setor de varejo apresentaram Nota Covid-19. Entre os fatores mais evidenciados, destacamos o baixo impacto percebido pelas empresas e a adoção de práticas de trabalho que visam proteger a saúde dos empregados.

Todas as empresas analisadas afirmaram ter realizado testes de recuperabilidade e apenas a SINQIA registrou ajuste por impairment test.

A princípio, parece que as perdas estão sendo menores que as esperadas, fazendo com que as empresas não tenham a necessidade de registrar ajuste por impairment test. Aguardaremos o final do ano para saber se as demonstrações anuais trarão perdas às empresas e se os registros seguirão conforme recomendações do Conselho Federal de Contabilidade (CFC), através das normas NBC TG 01 – Redução ao Valor Recuperável de Ativos, NBC TG 46 – Mensuração do Valor Justo, NBC TG 48 – Instrumentos Financeiros, e NBC TG 24 – Evento Subsequente.

Fusões e aquisições no Brasil

Recuperação no 3ºT indica um 4ºT movimentado

Depois de um 2019 com número recorde de fusões e aquisições no Brasil, com um total de 1.231 operações (segundo levantamento da KPMG), a expectativa era de que o ano de 2020 superasse mais uma vez os números anuais alcançados até então. No entanto, ninguém contava com o aparecimento do coronavírus e todos os efeitos decorrentes da pandemia ao redor do globo.

Com a paralisação de empresas e do comércio em escala, resultantes de medidas sanitárias para contenção da Covid-19, a economia parou e o reflexo pôde ser verificado na luta diária das empresas para preservação de caixa, bem como a grande queda do mercado de capitais no primeiro semestre. No que diz respeito às operações de fusão e aquisição, observou-se um cenário pouco atrativo para a abertura ou avanço de negociações com uma redução de 25% nas transações no primeiro semestre de 2020 em comparação com o mesmo período de 2019 (segundo TTR).

Depois de virada a página do período mais turbulento, encontramo-nos num cenário com a menor taxa básica de juros da história, em que se observa um processo de transferência dos recursos alocados em renda fixa para a economia real. Da mesma forma, com a baixa remuneração dos investimentos, as transações tornaram-se atrativas  exigindo menor retorno dos novos projetos aliados com a redução do valor de empresas mais afetadas pela crise.

Esses fatores acarretaram dois tipos de movimento:

1) Empresas com caixa aproveitando oportunidades de negócio, seja diversificando suas atividades ou então investindo em tecnologia para se adaptar às novas condições impostas pelo distanciamento social;  

2) Empresas que estão vislumbrando oportunidades pela sinergia de suas operações com o intuito de conseguirem se reerguer mais rapidamente – leia mais sobre Sinergia em nosso artigo.

No primeiro caso citado, podemos observar as movimentações da Magazine Luiza que, durante o período de pandemia, já adquiriu seis operações apostando cada vez mais em serviços digitais. Também podemos citar o grande volume de negociações envolvendo startups, com o número recorde de 100 transações em 2020 contra 63 em 2019 e 27 em 2018 (Fonte: Estadão). Neste último caso, essa movimentação ocorre justamente pela necessidade de grandes empresas se atualizarem digitalmente, onde a aquisição de produtos e serviços já desenvolvidos por essas startups, encurta o tempo a ser despendido para reprodução de algo semelhante.

No segundo caso, podemos usar como exemplo a operação envolvendo a Localiza e Unidas, duas empresas do mesmo setor que anunciaram sua união, o que vai gerar um gigante no segmento, aproveitando dos fatores de sinergia originado da transação (aprovação ainda depende do CADE). Outras ocorrências semelhantes podem ser verificadas em setores diferentes.

Visto isso, se no primeiro semestre a queda de transações em 2020 foi de 25% quando comparada com 2019, no acumulado até setembro esse número já reduziu para 15% indicando um mercado de M&A mais aquecido desde julho. Aliado a isso, podemos verificar o grande número de solicitações de registros de ofertas iniciais de ações ou units (65 pedidos segundo a CVM até 25/10/2020), e a grande maioria indicando a intenção de realizar aquisições com o dinheiro captado.

É certo que o impacto da crise foi e continua sendo grande, mas a recuperação está ocorrendo e o último trimestre de 2020 promete movimentar ainda mais a área de fusões e aquisições no Brasil.

Preocupações com a Economia Mundial

A sustentabilidade da recuperação da atividade econômica

Após seis meses do início da pandemia, as principais economias mundiais começaram a indicar uma recuperação mais consistente de suas atividades produtivas. É certo que os países enfrentaram seus períodos mais críticos de contaminação de forma heterogênea. Alguns governos adotaram medidas mais rígidas, outros foram mais flexíveis em relação ao distanciamento social. Em termos econômicos, contudo, a recuperação mundial está ocorrendo de forma mais rápida do que se imaginava. No entanto, indicadores do mercado de trabalho mostram que a retomada está ocorrendo de forma desequilibrada.

Na China, por exemplo, o lado da oferta se recuperou muito rapidamente e acima das previsões iniciais, mas a próxima etapa da consolidação depende do lado da demanda, principalmente do consumo das famílias. O isolamento social causou grandes perdas de renda para muitas famílias de menor poder aquisitivo que não foram compensadas pelos pagamentos de auxílio governamental. Durante o processo de recuperação, essas famílias terão uma maior propensão a poupar, conforme identificado pelo Banco Popular da China, seu banco central. Esse movimento cria uma preocupação adicional, pois restabelecer o nível de demanda para sustentar a rápida recuperação da oferta poderá ser mais complicado. 

Durante a Grande Depressão dos anos 1930, o economista inglês John M. Keynes chamou atenção para esse problema, intitulando-o como o paradoxo da parcimônia. Pela lógica convencional, aprendemos com o tio Patinhas (personagem de Walt Disney) que o excesso de poupança ajuda no enriquecimento das famílias. É claro que poupar e investir bem é fundamental para o acúmulo de riqueza econômica e financeira; porém, movimentos agregados de excesso de poupança, no curto prazo, são recessivos. A preocupação do pensamento keynesiano baseia-se no argumento central de que, em períodos de incerteza, o excesso de poupança das famílias dificulta a retomada da economia. Nesse caso, a melhor maneira de restabelecer o nível de demanda e sustentar uma recuperação consistente passa, necessariamente, por um programa de estímulos governamentais, sustentando o nível de renda disponível das famílias.

O choque econômico do bloqueio da Covid-19 recaiu mais pesadamente sobre as famílias de baixa renda, na China e em outros lugares, tal como nos EUA. Embora os funcionários administrativos pudessem trabalhar em casa e se isolar dos efeitos diretos do bloqueio, dezenas de milhões de trabalhadores na indústria e no varejo perderam semanas ou meses de renda. As horas pagas para os trabalhadores chineses e norte-americanos caíram em um ritmo nunca visto antes consumindo suas economias. Portanto, a retomada da renda poderá gerar uma necessidade racional de restabelecer seus níveis de poupança pré-Covid. 

Os países desenvolvidos vêm relatando uma recuperação mais rápida no nível de vendas de produtos de luxo, eletrônicos, material de construção e automóveis. Em compensação, a recuperação nas compras de vestuário, alimentos e serviços básicos mostrou-se mais estagnada. Nos EUA, a renda pessoal disponível (salário + assistência do governo + seguro-desemprego) caiu 2,7% em setembro comparado a julho. Ademais, a recuperação do mercado de trabalho no terceiro trimestre mostrou perder fôlego, trazendo preocupações quanto ao avanço do consumo das famílias nos próximos trimestres.

Nesse sentido, uma das formas de restabelecer com maior rapidez o nível de consumo das famílias de baixa renda requer a adoção de uma política governamental focada na redução da taxa de desemprego da força de trabalho. Por isso, os estímulos do novo pacote fiscal do Governo dos EUA buscarão injetar US$ 2,2 trilhões, evitando uma piora no desempenho do mercado de trabalho. Ademais, uma política fiscal expansionista ajudará o Fed a evitar uma depressão ainda maior nos preços dos serviços. As discussões sobre o pacote fiscal ainda estão avançando na Câmara de Deputados e no Tesouro dos EUA.

Impairment Test do setor de varejo

Empresas do setor de varejo seguem as normas do CFC

Nossas perspectivas sugerem que teremos uma grande demanda por trabalhos de impairment test de ativo imobilizado e intangível, bem como fair value da carteira de recebíveis, covenants e, em alguns casos, going concern para as empresas.

Esse fenômeno está atrelado aos efeitos financeiros ocasionados pela Covid-19, obrigando as empresas a estimar, reconhecer e registrar perdas oriundas do impacto da pandemia nos negócios. 

O alerta já foi dado em março pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários), que destacou “a importância de as companhias abertas e seus auditores independentes considerarem cuidadosamente os impactos da Covid-19 em seus negócios e reportarem nas demonstrações financeiras os principais riscos e incertezas.”

Para identificar como essas informações vêm sendo tratadas pelas empresas de capital aberto, selecionamos um setor que supomos sofrer grande impacto: varejo (o segundo artigo da série; para acessar o primeiro – “Viagens e Lazer” – clique aqui), conforme a Classificação Setorial das Empresas Negociadas na B3, disponível no seu site. Analisamos as notas explicativas com o objetivo de constatar a existência de nota específica para o evento Covid-19, suas razões e se houve ou não registro de perda por impairment realizado pelas empresas, de acordo com a tabela a seguir:

Fontes:
As DFs foram disponibilizadas pelas empresas em www.b3.com.br, acessadas em 19/09/20, ou no site das próprias empresas.

Constatamos que todas as empresas do setor de varejo apresentaram nota COVID-19. Entre os fatores mais destacados, referentes aos impactos sofridos e medidas tomadas, encontramos: suspensão de contrato de trabalho, redução de jornada, renegociação de contratos de aluguel e revisão de despesas.

Com exceção de LOJAS MARISA e GRAZZIOTIN, todas as outras fizeram análise de impairment test por meio do fluxo de caixa futuro. Das sete empresas do setor, cinco fizeram teste (72%). Nenhuma delas identificou necessidade de ajuste por impairment test.

Esperamos que as demonstrações financeiras ao longo de 2020 demonstrem adequadamente os efeitos financeiros da Covid-19  conforme recomendado pelo CFC (Conselho Federal de Contabilidade), através das normas NBC TG 01 – Redução ao Valor Recuperável de Ativos, NBC TG 46 – Mensuração do Valor Justo, NBC TG 48 – Instrumentos Financeiros e NBC TG 24 – Evento Subsequente.

Valor de Sinergia

O Valor de Sinergia em processo de M&A

Entre as diversas metodologias existentes para se realizar o Valuation de uma empresa, a que atualmente é a mais completa e aceita pelo mercado é o método de fluxo de caixa descontado, devido à abrangência de variáveis que essa técnica contempla, mitigando as possíveis incertezas que fazem parte do estudo de Valuation.

Dentre essas variáveis, podemos citar o efeito do valor de controle bem como o do valor de sinergia, comum em processos de fusão e aquisição de empresas, que acaba gerando criação de valor para o acionista quando ocorre. 

Neste artigo focaremos no valor de sinergia e suas principais características.

Inicialmente, é necessário definir o conceito de sinergia. De acordo com o dicionário da Oxford Languages, é a “coesão dos membros de um grupo ou coletividade em prol de um objetivo comum”. Ainda, o mesmo dicionário traz a definição da palavra aplicada ao mundo dos negócios: “ação conjunta de empresas, visando obter um desempenho melhor do que aquele demonstrado isoladamente”. Dessa maneira, o termo sinergia, quando praticado no meio empresarial, refere-se a benefícios que duas ou mais companhias conseguiriam ter em conjunto caso ocorresse a união delas.

Tendo o conceito em mente, conseguimos então pensar diversas situações em que ocorre sinergia entre duas empresas: no caso de dois concorrentes se unindo para ganhar mercado; um parque fabril sendo utilizado por duas empresas diferentes para redução de custos; ou então dois clientes que se unem para negociar preços melhores com um determinado fornecedor.

Em uma operação, conseguimos segregar a sinergia em operacional e em financeira. A primeira diz respeito aos casos já citados no texto, que incluem, por exemplo, economia de escala, maior crescimento em mercados novos ou existentes e maior poder de precificação. Já a segunda se refere ao aproveitamento estritamente financeiro, como benefícios fiscais, capacidade de endividamento, ou o fato de a rentabilidade de uma conseguir suportar um investimento maior em outra.

Quando avaliamos empresas em que seja identificável a ocorrência de sinergia decorrente de sua aquisição, fusão ou qualquer outro arranjo societário, é de fundamental importância a sua valoração para que a tomada de decisão na negociação seja realizada de maneira consciente e embasada em premissas pautáveis. Portanto, é imprescindível o estudo de caso de maneira individualizada de cada operação para que sejam identificadas as sinergias provenientes, como o aumento das margens de lucros, a entrada facilitada em novos mercados etc. bem como o momento a partir do qual esse benefício refletirá nos fluxos de caixa das duas empresas em conjunto.

Para conseguirmos então distinguir o valor da operação que será resultante da sinergia, é realizado o Valuation da empresa-alvo de maneira separada, antes do processo de fusão/aquisição (taxas distintas de crescimento, de desconto etc.) e, na sequência, é desenvolvido o Valuation da empresa resultante já considerando o impacto da operação no fluxo de caixa.

Em estudos de sinergia, alguns cuidados devem ser tomados para que o valor justo reflita a realidade. As sinergias geradas devem ser projetadas com um certo grau de conservadorismo, pois é comum que se extrapole no otimismo. Outros cuidados que precisam ser tomados dizem respeito: ao custo de capital das operações, que deve ser realizado antes e depois da empresa resultante; ao acúmulo de caixa, que deve ocorrer sempre na empresa resultante e não na empresa alvo; e a não utilização de uma taxa livre de risco para descontar os fluxos da sinergia visto que fluxos provenientes de sinergia sempre possuem um risco maior.

A Valuup Consultoria é especializada em Valuation e no estudo de valor de controle e sinergias gerados em processo de M&A. Entre em contato para aprofundar o assunto e falar dos desafios da sua empresa.

Boom de Recuperações Judiciais vem mesmo?

Com o alto índice de fechamento de empresas durante a pandemia, pode ser que o boom de Recuperações Judiciais vire um boom de falências

Estamos a quase 200 dias da decretação do estado de calamidade pública no Brasil. O momento de paralisia das empresas e mercados passou, alguns seguimentos se reinventaram, outros simplesmente sucumbem em silêncio. E a sensação que paira no ar é de que o pior já passou e que os índices de confiança começam a retornar. “A prévia da Sondagem da Indústria de setembro sinaliza avanço de 7,2 pontos do Índice de Confiança da Indústria (ICI) em relação ao número final de agosto para 105,9 pontos. Se o resultado se confirmar, esse será o maior valor do índice desde janeiro de 2013 (106,7 pontos)” (IBRE/FGV).

Mesmo com a retomada na confiança, no backstage das Recuperações Judiciais ainda se espera o boom de novos pedidos – no início da pandemia falava-se de mais de 3000 pedidos em 2020. Porém, segundo os dados fornecidos pela Serasa Experian, fechamos agosto com 868 novos pedidos de RJ em 2020. São 68 pedidos a menos do que no mesmo período do ano passado e 367 pedidos a menos do que em 2016, ano com o maior número de pedidos da história: 1863.

Analisando todo o contexto e cruzando algumas informações, começamos a acreditar que vai sim haver um incremento no número de Recuperações Judiciais, mas nada de boom.

Quando analisamos o histórico do PIB versus as RJs requeridas, é possível notar um efeito claro de defasagem temporal[1], ou seja, quando o PIB cai, as Recuperações Judiciais só começam a aumentar nos anos seguintes.



Nessa perspectiva, um PIB como o estimado no relatório Focus do Banco Central nesta semana, sendo -5,05%, acarretaria um boom em 2020/2021. Porém, de 2010 até agosto de 2020, a divisão dos pedidos por porte é 63% de Micro e Pequenas Empresas, como registrado no gráfico a seguir:

Na pesquisa Pulso Empresa do IBGE, foi declarado que “522,7 mil (39,4%) encerraram suas atividades por causa da pandemia, sendo que 518,4 mil (99,2%) eram de pequeno porte”. Assim sendo, os primeiros reflexos econômicos da pandemia foram sentidos majoritariamente pelas pequenas empresas, que não vão pedir o remédio legal da Recuperação Judicial, simplesmente elas vão fechar as portas, fator esse que achata a curva de novos pedidos de RJ e pode levar a um boom nos pedidos de Falências.

[1] É a diferença no tempo de uma ação e o efeito do impacto.